Holambra (10): Crianças e escola

A união entre brasileiros e holandeses, foi fundamental para o progresso de todos. Mesmo tendo a dificuldade de comunicação verbal, os holandeses aprenderam muito com os colonos e vice versa! No entanto, a falta de saberem falar o português, fez com que muitos brasileiros temessem seus empregadores. Ao longo de minhas entrevistas com ambas as partes, encontrei a explicação. O tom de voz usado pela ansiedade de não se fazer entender e usando frases misturando as línguas como “dar water”, deixava as relações um pouco acaloradas. Com o tempo, cada um foi se acostumando.

A escola foi fundamental para o idioma se tornar o menor dos problemas na comunidade. As crianças que até os quatro ou cinco anos, só falavam holandês em casa, na escola começaram a ter aulas em português. Assim, em diversas situações, puderam ajudar seus pais a se comunicarem com os brasileiros. E os pais assim,  aprenderam com as crianças.

Alguns filhos de imigrantes tinham mais contato com crianças, filhos de colonos, o que acelerou o aprendizado do português.  Mas, assim surgiu um terceiro idioma, só conhecido aqui na Fazenda e ainda usado até hoje! Palavras em português, emendadas com sonância em holandês. “Corage” é uma delas, significando ‘coragem’, ou a palavra ‘saudade’ que entrou para o dicionário holandês.

Pensar em não ir à escola, não existia! Era o momento de encontrar os amigos, de brincar juntos na hora do recreio. Para ir à escola, já começava divertido, com o transporte de charrete ou carroça e dando carona para colegas pela estrada. Alguns percursos levavam mais de hora e ninguém reclamava da chuva, quando ela caía. Tudo era diversão! Essas charretes ficavam estacionadas ao lado da escola ou próximo à igreja. Muitos traziam balde para dar água ao cavalo, pois vários animais ficavam longe de seu pasto por mais de cinco horas.

As professoras eram muito queridas. Já as freiras assustavam um pouco! Entre os nomes que hoje nos deixam saudosos, estão Irmã Benedictus,  Irmã Gemma, Irmã Irmentrudes (mais tarde mudou o nome para Irmã Helena), D. Belinha e sua irmã D. Zelinda, D. Zélia, mas a que mais marcou a todos, certamente foi D.Tiny Vermeulen. Uma pessoa extremamente doce, gentil e com a paciência invejada.

Com D. Tiny, iniciávamos o aprendizado em grupo e nos familiarizamos com tesoura, papel e cola. Muito artesanato foi nos ensinado, embora ela desse sempre seu toque final, para embelezar os nossos trabalhos. Para entrar em nossa primeira sala de aula, passávamos por um grande hall, onde uma longa parede dispunha de vários cabides, para pendurar as lancheiras. O cheiro era muito forte de leite com chocolate.

Para muitas crianças, foi a  Irmã Gemma que ensinou as primeiras letras. E ela era bastante exigente, fazendo a todos o uso do caderno de caligrafia. Ela não precisava, pois sua letra era muito linda! E com a D. Zelinda, a melhor hora da aula era quando ela ensinava desenho e pintura. Já os meninos não gostavam!

Quem estudou com a Dona Zélia, embora suas aulas fossem mais ‘puxadas’, certamente traz na lembrança, a sua elegância e simpatia.

Todas as crianças, de todas as séries e em todos os anos, eram comportadas e bastante estudiosas. Todos temiam as notas baixas ou chamadas de mau comportamento, pois no final do ano os Pedros Negros* passariam na escola para verificar as anotações sobre cada aluno e levavam a informação para o São Nicolau*. No dia 06 de dezembro, seria o ‘bom’ velhinho a fazer o julgamento. Bom comportamento e boletim ganhava presente e o contrario, ou levava varetadas ou era “ensacado” para ser levado à Espanha. Tradições holandesas ou não, melhor era temer e respeitar.

Quando o sino tocava, avisando o término da aula, muitas crianças seguiam para casa, sabendo que passariam a tarde brincando com seus irmãos ou iriam ajudar nos trabalhos do sítio. Cada ajuda ao pai era necessária. Os que não tinham irmão para brincar e não precisavam ajudar nas atividades do sítio, buscavam diversão às vezes ‘proibida’.

Era o meu caso! Embora eu tivesse quatro irmãos, a diferença de idade entre eles e mim, era muito grande.  Então, proibida por minha mãe a sair de casa, eu pulava a janela do quarto e ‘fugia’ para a casa do colono. Lá eu me deliciava subindo em árvores, brincando com barro e o melhor da minha infância, comia delicias feitas pela D. Mercedes  Pereira, que tinha mãos de fada para lidar com forno e fogão a lenha. Bolo de fubá e polenta com sardinha, era o que eu nunca vi sobre a mesa preparada por minha mãe. O grande problema era voltar para casa, bem alimentada e ainda ter que jantar com a família. Se eu não mostrasse apetite, minha mãe poderia descobrir as minhas fugas!

Outras escapadelas era para brincar no sítio da “Tante”* Mina Krabenborg. Lá o sabor de infância foi registrado com um delicioso sorvete caseiro de nata. Sabores e lembranças que ficarão para sempre!

* Pedros Negros são os ajudantes de São Nicolau, o Papai Noel Holandês.

*Tante ou Oom, era como nós, crianças  e depois adultos que não tínhamos família aqui na fazenda, chamávamos os amigos mais próximos de nossos pais. E deles recebíamos o carinho de tia ou tio. Embora não de sangue, todos sentiam  ter uma enorme família.

Próxima, um especial, a parte 11 – Holambra – A Conquista – Os anônimos.

Deixe aqui o seu comentário. Até lá!

Pesquisa e texto : Catharine Welle Sitta


Geef een reactie

Je e-mailadres wordt niet gepubliceerd. Vereiste velden zijn gemarkeerd met *